A montanha mágica

quinta-feira, maio 09, 2013

Houve muitos dias que esperei religiosamente pela noite também por causa dos episódios de séries de tv que considerava muito importantes: ajudavam-me a desfazer nós, a seguir por veredas e carreiros que me mostravam um olhar diferente sobre… a vida, digamos assim. 

Acho que nunca tinha ouvido ou visto nas tvs qualquer referência a Flannery O`Connor. Comecei a seguir “Hannibal” com pouca curiosidade mas ainda assim para ver como é que eles iam tentar matar o Lecter Hopkins.
Surprise, surprise!
E depois. Depois.





Depois vemos Abigail acordar do coma e depois sentada na cama a ler.
Tem nas mãos a ´Antologia` de Flannery O`Connor que a Dra. Alana Bloom (“professora de psicologia, consultora do FBI e ex-aluna de Hannibal Lecter”) lhe deixou em cima da mesinha de cabeceira. 
Desta vez não sabemos qual é o conto. 
But. 

E depois achei que seria interessante juntar algumas notas que Flannery escreveu sobre a televisão, dada a sua acutilante atualidade e também porque tem sido ela o centro das atenções nestes primeiros episódios e que. 

Ora: 

“No dia 30 [Maio de 1955] vou a Nova Iorque para, quem diria!, dar uma entrevista ao senhor Harvey Breit para um programa que passa na cadeia NBC. Também vão encenar/dramatizar a cena inicial de ´A vida que salvar pode ser a sua`. Achas que isto me vai corromper?
 Todos os que leram ´Sangue Sábio` crêem que sou uma rude niilista, todavia penso passar a imagem de uma tomista desajeitada, ainda que, provavelmente, não serei capaz de pensar em nada para dizer ao senhor Harvey Breit que não seja ´Eh?` e ´Não sei`. Quando regressar se calhar terei de passar três meses dia e noite no galinheiro para lutar contra essas más influências.”

 Junho de 1955:

 “Na televisão foi medianamente horrível e estou encantada por estar de regresso com os frangos, que não sabem que acabo de publicar um livro.”

 Março de 1961:

 “As monjas estavam tão agradecidas por lhes ter arranjado um editor que me ofereceram um televisor portátil. É claro que fiquei atónita. Uma delas tem um irmão que lhe deu o televisor para que ela mo oferecesse. Elas não têm dinheiro próprio. Assim, finalmente a mamã e eu entramos no século XX. Agora posso contar-te tudo sobre medicinas como Geritol, Pepto-Bismol, Anacin, Bufferin, qualquer tipo de sabonete ou de cera para o chão, etc., etc. Afortunadamente, temos um canal educativo que passa programas interessantes.”

 Novembro de 1963:

 “A morte do presidente afetou muito o país. Todas a televisões comerciais pararam até ao fim do funeral, e, inclusivamente, os jogos de futebol foram cancelados, que é o maior símbolo de luto possível. A política sulista, que se inspirou e navegou muito sob a inspiração do ´maldito Kennedy`, tem agora de recolher as suas velas…”

 Maio de 1964:

 “Aquela operação de fevereiro reactivou-me o lúpus e há poucos dias estive no hospital outra vez. Agora estou em casa mas como diz a personagem da televisão «não faço nada, só estou ali sentada».”

 Termino com S. João da Cruz: "Para chegar ao que não sabes,/hás-de ir por onde não sabes."

posted by Luís Miguel Dias quinta-feira, maio 09, 2013

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São horas, Senhor. O Verão alongou-se muito.
Pousa sobre os relógios de sol as tuas sombras
E larga os ventos por sobre as campinas.


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