terça-feira, novembro 01, 2011
quando a parolice é muita; tinha a boca atulhada de ouro e estava inchado por todo
no correio da manhã do passado domingo, 30/10/2011, o secretário de estado da cutura sobre o fim das entradas gratuitas nos museus aos domingos de manhã
"jornalista:
- Quanto é que se vai ganhar cobrando-lhes bilhete?
secretário de estado da cultura:
- Um milhão de euros."
no mesmo domingo, 30/10/11 mas agora no jornal público:
"jornalista:
- Quanto é que se ganha com uma medida como a do fim da gratuitidade dos museus?
secretário de estado da cultura:
- Quer o número? Dois milhões."
Depois de ter lido as duas entrevistas fiquei com a impressão de que o responsável político deu respostas rápidas, transpirando confiança, assertivas e excessivas, a roçar a hybris "É preciso voltar à mesma frase ´que parte é que não percebeu? Não há dinheiro", estilo gingão, e como se pode ver parolas, "quer o número"; mas dizem que tem boa imprensa. Diz que se encontra uma vez por semana com outro parolo, primeiro ministro da república de portugal, para falarem sobre cultura, e como se pode ler mais milhão menos milhão... O estado de exceção em ação.
Disse também "por outro lado, faz sentido fazer um grande Museu dos Coches", eheheheh, sem palavras.
De Heródoto: "Os Alcmeónidas eram, desde há muito tempo, pessoas ilustres em Atenas, mas a partir de Alcméon e de Mégacles, dispensou ajuda e zelosa colaboração aos Lídios vindos de Sardes, da parte de Creso, a fim de consultarem o oráculo de Delfos; e Creso, ao tomar conhecimento, através dos Lídios que consultaram os oráculos, do auxílio que ele prestara, fez com que Alcméon viesse a Sardes e, mal este chegou, deu-lhe de presente todo o ouro que ele fosse capaz de levar sobre a sua pessoa de uma só vez. Alcméon, perante uma oferta nestes termos, valeu-se do seguinte expediente: vestiu uma grande túnica e nela deixou uma prega profunda, calçou os coturnos mais largos que conseguiu encontrar e assim entrou no interior da câmara do tesouro para onde o conduziram. E, atirando-se para cima de um monte de ouro em pó, primeiro meteu à volta das pernas tanto ouro quanto os coturnos puderam aguentar; depois, encheu também toda a prega da túnica, polvilhou a cabeça com pó de ouro, levou outro pedaço à boca e saiu do tesouro, a custo arrastando os coturnos, mais semelhante a tudo que a um ser humano: tinha a boca atulhada de ouro e estava inchado por todo. Ao vê-lo, Creso não conteve o riso; e não só lhe deu tudo quanto ele trouxera como ainda lhe ofereceu outros presentes em nada inferiores àquele."
É a vida, milhão para a frente milhão para trás importa também que "faz sentido fazer um grande Museu dos Coches".
Outro exemplo do espaço público e da sua qualidade, que nos ocupa e atropela:
no último atual, 29/10/2011, semanário expresso, Clara Ferreira Alves, enviada a nova iorque, entrevista, sim, não foi conversa, Don DeLillo "o autor americano" escreve a jornalista, parolice já se vê, não pelo escritor mais por ela, adiante.
Como já falamos em impressões voltemos a elas, quando li a entrevista tive a impressão de ver uma jornalista em bicos de pé o tempo todo, olhe para mim, olhe para mim, veja, agora uma pirueta e agora... mas o mortal à retaguarda não o soube dar, esfrangalhando-se no chão.
E esse mortal à retaguarda que ela tanto almejou, quis e não conseguiu estatelou-se em definitivo nas últimas perguntas quando diz a DeLillo "Nunca explorou o tema grande da religião. Outro grande tema americano". E o escritor ainda lhe deu umas pistas mas a jornalista já dolente dos dedos dos pés não o discerniu, Cosmopolis e assim, e, assim, portanto, as perguntas anteriores deveriam ser reformuladas; aliás, até o célebre Casanova não percebeu Cosmopolis e de vez em quando ainda por lá se aventura.
E, à semelhança de outros jornalistas, como levava perguntas feitas não soube ou não quis entrar nas pistas palavras do escritor, tanta livro lido para chegar a um momento culminante, supõe-se, e...
A DeLillo voltarei amanhã.
(imagem do catálogo Angelo de Sousa y Escultura, Centro de Arte Moderna F.C.Gulbenkian, 2006)
posted by Luís Miguel Dias terça-feira, novembro 01, 2011