quinta-feira, novembro 10, 2011
Da Democracia (11)
Outra versão: "A história é contada pelos Persas de duas maneiras”, e a segunda é: “contam então que o escudeiro tocou nos órgãos sexuais dessa égua e manteve a mão escondida nas suas calças, compridas e largas; conta-se ainda que, ao nascer do sol, quando os cavalos estavam juntos, prestes a avançar, Ebares, estendendo a mão, aproximou-a das narinas do cavalo de Dario – e o animal, ao sentir o cheiro, soprou com força e relinchou.”
Depois, olhemos para alguma investigação:
i) “este processo de designação do futuro monarca inscreve-se nas tradições de um povo adorador do sol e dado à contemplação do levantar do astro-rei, um povo de cavaleiros, para quem os cavalos eram consagrados à divindade e oferecidos em sacrifício;
ii) “entre os Persas os relâmpagos e o trovão poderiam ser interpretados como sinais do seus supremo Ahura Mazda, principal divindade do Zoroastrianismo, criador do céu;
iii) “Que a história de Dario pode ter sido adaptada dum texto assírio,sobre Sargão II;
iv) “Georges Dumézil explica que, nos tratados rituais védicos, o cavalo assume um papel essencial em dois rituais régios: o vajapeya e o asvamedha. Neste último, o futuro monarca era designado graças ao seu cavalo: se, deixado em liberdade durante um ano, o animal não fosse morto nem capturado, isso significaria que o seu dono o deveria sacrificar como oferenda, na qualidade de rei; no ritual do vajapeya, o futuro rei sacrificava a montada que o ajudara a vencer uma prova equestre.”
Ao longo da leitura dos diferentes volumes de Histórias fui também anotando as vezes em que os diferentes investigadores, historiadores, iam dizendo que Heródoto errou aqui neste dado, se enganou ali noutro, que Heródoto não sabia ou confundiu, que é muito diferente do que Heródoto escreveu e assim muitas vezes em mais coisas. Para que fique claro, os volumes de Histórias de Heródoto são um monumento, os investigadores portugueses que escreveram as diferentes introduções, notas, comentários fizeram um excelente trabalho, mas ainda faltam três volumes, e depois se calhar fazer um só livro com os nove livros, mas a certa altura, já não interessa dizer se Heródoto se enganou ou se confundiu, tal é a riqueza do que escreveu. Nas notas de rodapé, tenho dúvidas é no uso/utilização do conceito classe ou classes, que só deverão ser empregues depois de 1789 d.C.
Lembrei-me também, ao longo da leitura das riquíssimas notas de rodapé, de uma história do precioso livro de Tonino Guerra O livro das igrejas abandonadas:
O sino
"A igreja fica ao pé de um cemitério onde está sepultada uma rapariga que se chamava Unichetta. Para se ver o sino, que é o mais velho da montanha, há um campanário que deve ter metro e meio de largura com duas escadas de mão que se enfiam primeiro num buraco: daqui sai a segunda que leva lá acima. Ninguém sabe quem a fez e em que ano.
Um dia veio de Santarcangelo um homem de uns oitenta anos que é explorador de palavras escritas nos livros antigos ou nas pedras. Um amigo de Pennabilli devagarinho ajudou-o a subir os degraus da primeira e da segunda escada até chegarem lá acima mortos de cansados e todos cheios de pó.
Assim que o professor viu aquele sino suspenso no meio da arcada que dá para o precipício, abraçou-o e manteve-o apertado durante dez minutos como se fosse um filho que tornasse da guerra. Depois largou-o e ele e o outro desceram as escadas com todas as precauções.
Mal acabou de descer, sacudiu com grandes palmadas o pó do casaco e entretanto dizia que o sino o construíra Iacobus Aretinus em 1316. Como resolveu o problema só Deus sabe, porque, do lado que se via, o sino era liso e sem datas.
Soube-se um ano depois. Contou que a escrita no bronze estava do outro lado e ele lera uma letra de cada vez com os dedos. Por isso o abraçara, e não por outra coisa qualquer."
posted by Luís Miguel Dias quinta-feira, novembro 10, 2011