domingo, julho 31, 2011
1.2. Quem espera por Sapatos de Defunto Morre Descalço, 1970.
excerto dos extras, Luís Miguel Cintra: "E eu senti, de facto, o que era a força e a violência do cinema, de filmar uma pessoa. Por aí, lembro-me que tive uma reacção nervosa muito forte no fim do dia a dizer que não queria fazer mais cinema, porque era uma violência, era entrar na privacidade e no íntimo de uma pessoa, e que a câmara era uma coisa monstruosa, um objecto de uma agressividade muito grande, etc.
Isso nunca mais me esqueci por que foi de facto a minha primeira impressão do cinema, do lado do actor, não é. E creio que fiquei com isso muito associado à minha ideia de cinema, de facto eu senti na pele, logo no primeiro dia de filmagem, que filmar é uma coisa muito importante e que é uma coisa muito delicada, é um acto grave, pôr uma câmara à frente de uma pessoa.
Isso fez-me, não sei se foi isso, ou também aquilo que penso noutras áreas, fez-me detestar o cinema que não tem isso em conta, portanto, o cinema… acho pornográfico ou obsceno o cinema que não respeita ou que não tem em conta a pessoa que tem à frente da câmara. O cinema que de facto não percebe que de facto a câmara é uma espécie de máquina de aumentar gigantesca não só a superfície mas como o que está por trás da superfície, quer dizer, o que é a personalidade, o que é o interior, a natureza de cada pessoa, e quem diz pessoas diz também paisagens, quer dizer, a maneira de filmar, o enquadramento, a luz, a objectiva, tudo isso, os movimentos de câmara, etc, são uma maneira de criar uma relação com o real, uma maneira de criar uma relação com o objecto, ou com a pessoa que se tem à frente.
Reconheço isso de muitas maneiras com os realizadores com quem tenho trabalhado, mas de facto senti isso na pele no primeiro filme do João César e acho que… que reconheço, depois, em todos os outros filmes seus uma fidelidade a essa noção de cinema. Quer dizer, com o César, de facto, a gente tem a noção de que filmar é uma coisa muito muito importante."
outro excerto dos extras, Luís Miguel Cintra: "a exigência de uma pureza de olhar, creio que há qualquer coisa de uma espécie de desejo de facto de pureza, de limpeza da relação entre o actor e a câmara, de relação verdadeira entre o actor e a câmara que lhe interessa muito. Quer dizer, de certa maneira interessa-lhe captar uma certa inocência do actor, que pode revestir muitos aspectos. No caso dos Sapatos era inocência mesmo, porque não havia qualquer espécie, da minha parte, e da parte dos outros actores também, qualquer espécie de técnica de representação. No caso dos filmes posteriores, creio que a inocência era a outro nível, quer dizer, era num nível de facto não se esconde, uma pessoa não se esconder não mentir perante a câmara, ou se mentisse mentisse com toda a sua personalidade, portanto."
excerto de João César Monteiro:
excerto de, entrevista com João César Monteiro por Lauro António:
posted by Luís Miguel Dias domingo, julho 31, 2011