terça-feira, dezembro 29, 2009
If you ever go to Houston (20)

fotogramas de Uma História de Violência, de David Cronenberg
Ainda na mesma entrevista quando lhe pediram para contar um segredo George Steiner disse que o comunismo, mais cedo ou mais tarde, vai impôr-se, triunfar.
Agustina Bessa-Luís, creio que foi, disse há algum tempo atrás que vivendo numa sociedade em que todos nos vemos a todos e a quase tudo as desigualdades vão ter, obrigatoriamente, de se esbater. Com mais violência ou com menos violência, dependendo do comportamento que formos, enquanto conjunto de homens e mulheres que vamos vivemos lado a lado, tendo e adoptando.
É cada vez mais visivel que o regresso a uma nova espécie de polis grega, ateniense, já está em andamento. Como será o caminho?
Vejamos três ou quatro acontecimentos que marcaram os últimos tempos, só para vermos a não aceitação e intolerância que se vai apossando de nós devido à pornografia do favorecimento em directo com milhões e milhões de pessoas a assistir, e também a outro tipo de situações mais ou menos visíveis:
1) a meio e no final do passado mês de Maio o Chelsea jogou uma eleminatória a duas mãos com o Barcelona, no âmbito da mais importante competição de clubes de futebol do mundo; pelo menos é onde é mais bem pago e mais visto. O que é que aconteceu no jogo da segunda mão, em Londres, quando a equipa da casa ganhava por 1 a 0 e tinha a presença quase assegurada na final da mesma prova? O que milhões de pessoas viram em directo foi o juiz principal do jogo avaliar e julgar sucessivamente mal lances a favor da equipa londrina e a protelar a possível presença da equipa da Catalunha na dita final. A um minuto do final da partida o Barcelona conseguiu o que almejava.
A revolta que se foi apossando das pessoas que estavam no estádio e também em casa ao longo do jogo, pelas más decisões do juíz principal, explodiu no fim com alguns jogadores de cabeça perdida a querer tirar satisfações com o mesmo juiz. Drogba, por exemplo. Quem dos que estavam a ver achou que Drogba não tinha legitimidade para tal?
Ainda no futebol, há poucos dias atrás a selecção francesa conseguiu o apuramento, à custa da selecção da República da Irlanda, para o mundial da mesma modalidade que se vai realizar no próximo ano na África do Sul. Como foi conseguido esse apuramento, à vista também de milhares de espectadores e de milhões de telespectadores? Desta feita, até o governo Irlandês tentou anular as decisões dos juízes daquele jogo. Platini, defendendo o modus operandi da Fifa, respondeu assertivamente que não se repetia nada muito menos se anulava.
Como foi analisada esta situação por cá, em alguns jornais? No público, que é o jornal que diariamente leio, vi umas setas para cima nuns casos outras no sentido contrário, revelando uma grande confusão, um navegar ao sabor de sei lá o quê; diga-se, também, que o desporto no público mais parece o inimigo público todos os dias, o que tem algumas vantagens. Vejamos: um dia destes grandes elogios ao Barcelona que ganhou tudo, perfeito, mais ao seu treinador. À arbitragem do França-Irlanda que sim, que sim, estava muito mal. Há critérios ou não? Defende-se algo ou não? Da comunicação social espanhola nem falar, é do mais chauvinista que se pode ler, uma vergonha.
2) a agressão ao primeiro ministro italiano.
3) a agressão/empurrão ao Papa na Capela Sixtina no dia 24 de Dezembro.
No seguimento do If you ever go to Houston (18), o bem público numa polis democrática comum será cada vez mais um dos desígnios procurados e exigidos pela grande maior parte das pessoas e indivíduos. Quando se tentar ludibria-los que se esperem reacções mais ou menos violentas, individuais ou colectivas. Seremos capazes de abrir os olhos e olhar lá para dentro?
posted by Luís Miguel Dias terça-feira, dezembro 29, 2009