sexta-feira, julho 03, 2009
.
"Há duas maneiras de chegar a casa; uma delas é não chegar a sair. A outra é dar a volta ao mundo até regressar ao local de partida; tentei descrever esse género de viagem numa história que escrevi. Mas é com enorme alívio que me desvio desse tópico e me volto agora para uma história que nunca escrevi. Uma história que, à semelhança dos outros livros que nunca escrevi, é de longe o meu melhor livro de sempre; como, porém, é muitíssimo provável que nunca venha a escrevê-la, vou aproveitá-la simbolicamente neste livro, porque se trata de um símbolo da mesma verdade que quero aqui apresentar. Concebi-a como um romance, o romance daqueles amplos vales de encostas declivosas, nos flancos de cujas colinas estão gravados os antigos Cavalos Brancos de Wessex (1). Era um romance sobre um rapazito que vivia numa quinta, ou numa casa empoleirada numa dessas encostas, e que partia à procura de qualquer coisa, como por exemplo a efígie e o túmulo de um gigante; e, quando já estava bastante longe de casa, olhava para trás e via que a quinta dele, e o jardim de casa dele, coloridamente instalados naquela colina, quais divisões de um escudo bem polido, mais não eram do que elementos dessa figura gigantesca, dentro da qual ele sempre vivera, mas que era grande de mais para ele a conseguir ver quando a olhava de perto. Essa é, a meu ver, a imagem fiel do actual desenvolvimento de qualquer inteligência independente; e essa é a finalidade deste livro.
(1) Provável referência a uma figura pré-histórica de um cavalo estilizado, em cré branca, de grandes dimensões, que se encontra gravado nas colinas do Sul de Inglaterra."
G.K. Chesterton (trad. Maria José Figueiredo), O Homem Eterno, Aletheia Editores, 2009.
posted by Luís Miguel Dias sexta-feira, julho 03, 2009