A montanha mágica

sexta-feira, julho 04, 2008

O Monstro (2)






Cindy Sherman




"Johnson passou por dois quartos e chegou ao topo das escadas. Quando abriu a porta, grandes vagas de fumo saíram em torrente, mas, apertando Jimmie com mais força desceu, mergulhando no meio delas. Assaltaram-no todo o tipo de odores, ao percorrer este lance de escadas. Pareciam vivos de inveja, ódio e malícia. À entrada do laboratório, viu-se confrontado com um estranho espectáculo. O quarto era como um jardim na zona da flores ardentes. Chamas violeta, carmim, verde, azul, laranja e púrpura floresciam por todo o lado. Havia uma labareda precisamente com o matiz de um delicado coral. Noutro sítio, via-se uma massa que jazia apenas em inacção fosforescente como um monte de esmeraldas. Mas todas estas maravilhas só se podiam ver indistintamente através de nuvens de palpitante, rotativo, fumo mortífero.
Johnson deteve-se por um momento, à soleira. Gritou, de novo, num pranto de negro contendo a tristeza dos pântanos. De seguida, impeliu-se através do quarto. Uma labareda alaranjada atirou-se como uma pantera às calças alfazema. O animal mordeu Johnson até às profundezas. Deu-se uma explosão de um lado e, subitamente, ergueu-se diante dele uma delicada, trémula aparição cor de safira, como uma fada. Com um sorriso brando, ela bloqueou-lhe o caminho e condenou-o a ele e a Jimmie.

[...]

Na frontaria da casa, ouviram-se ordens ásperas. «Liguem a vossa água, Cinco!» «Abram-na toda, Um!» A multidão reunida oscilava para este e para aquele lado. As labaredas, a grande altura, projectavam uma luz rubra e bravia nos seus rostos. O clangor de uma companhia aproximou-se vindo de qualquer rua adjacente. A multidão exclamou, ao ouvi-lo: «Aí vem a Número Três!», «É a Três que aí vem!» Uma turbamulta ofegante, num andamento irregular, entrou impetuosamente no campo de visão, puxando uma carreta de mangueira. Os rapazinhos soltaram um grito de exultação. «Chegou a Três!» Os rapazes deram as boas-vindas à Imortal Companhia de Bombeiros Número Três, como se esta consistisse numa quadriga puxada por um grupo de deuses. Os cidadão transpirados atiraram-se para o meio da barafunda. Os rapazes dançaram de júbilo face às demonstrações de heroísmo. Aclamaram a aproximação da Número Dois. Deram as boas-vindas à Numero Quatro com aplausos. Estavam tão profundamente emocionados com todo este aparato, que ridicularizaram vivamente a aparição tardia da companhia de escadas de gancho, cujo pesado equipamento quase os havia atolado na colina da Bridge Street. Os rapazes odiavam e temiam um incêndio, é claro. Não desejavam particularmente que a casa de alguém ardesse, mas, ainda assim, era agradável assistir ao reunir das companhias e, no meio de um grande ruído, observar os seus heróis levar a cabo todo o tipo de prodígios.
Dividiam-se em facções, relativamente ao valor das diferentes companhias, e não defendiam as suas convicções com meias medidas."



Stephen Crane (trad. David Furtado), O Monstro e outros contos, Antígona, 2003.


posted by Luís Miguel Dias sexta-feira, julho 04, 2008

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Pousa sobre os relógios de sol as tuas sombras
E larga os ventos por sobre as campinas.


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