A montanha mágica

sábado, dezembro 22, 2007

Da graça e da Graça








1. O pietista Carter Lindberg, Professor Emérito de História da Igreja na Universidade de Boston, com vasta bibliografia dedicada a este tema, resolveu aceder às pressões da sua editora e resumiu as notas das suas aulas. O resultado foi uma História do Cristianismo que a Teorema decidiu traduzir e editar.
História do Cristianismo, projecto arrojado como refere o autor, é um bom ponto de partida para chegar a algum lado, ou a lado nenhum. Não percebo como é que é possível tentar escrever, resumir, condensar, uma história do cristianismo e não fazer referência à Igreja Ortodoxa. Nada. Sobre a Rússia... sobre a Grécia... nada. 268 páginas. Realmente é um pouco arrojado. Estranho.

Lindberg parece precisar de um espelho, e para isso nada melhor do que o de Tarkovski, onde às tantas se vê e se lê o seguinte: "«O divórcio das Igrejas separou-nos da Europa. Não participámos em nenhum grande evento dos que a abalaram. Mas tivemos a nossa própria predestinação. A Rússia, com as suas imensas vastidões, absorveu a invasão mongólica. Os tártaros não se atreveram a transpor as nossas fronteiras ocidentais. Voltaram aos seus desertos, e a civilização cristã foi salva. Para assim ser, assumimos uma existência especial, a qual, preservando-nos como cristãos, tornou-nos estranhos ao mundo cristão. No que diz respeito à nossa insignificância histórica, neste particular discordo do senhor. Não lhe parece que a Rússia atravessa hoje uma fase muito significativa, que excitará a imaginação dos futuros historiadores? Apesar de me sentir profunda e cordialmente ligado ao imperador, não posso aclamar tudo o que vejo em meu redor. Como literato, sinto-me irritado e ultrajado; mas nunca, juro, me passou pela cabeça trocar a minha Pátria, trocar a minha história, abdicar da história dos nossos antepassados, tal como nos foi dada por Deus.» Da carta de Puchkine a Tchaadaiev. Aos 19 de Outubro de 1836."

O capítulo onze, "As Igrejas Cristãs desde a Primeira Guerra Mundial", parece-me bom, dentro do possível num resumo, e traça um trilho para quem pouco sabia sobre ele, como é o meu caso.
Dois fragmentos:

"O próprio [Karl] Barth exerceu uma sucessão de cargos docentes na Alemanha até ser deportado por criticar os Nazis. Em Bona, Barth informou os seus alunos de que seria de mau gosto começar uma palestra sobre o «Sermão da Montanha» com um «Heil Hitler!». Mais umas críticas vigorosas ao Nacional-socialismo conduziram Barth perante um tribunal nazi sob a acusação de aliciar as mentes dos alunos. A sua defesa consistiu em ler a defesa de Sócrates perante o tribunal ateniense. Os juízes não acharam graça e Barth foi expulso. Então, passou a ser professor em Basileia."

"Em Maio de 1934, esses pastores formaram a «Igreja Confessante». A sua Declaração de Barmen repudiava toda e qualquer síntese da fé cristã com o Nacional-socialismo e proclamava lealdade total às afirmações da revelação bíblica. Os autores esclareceram bem que se os Cristãos Alemães obtivessem êxito, a Igreja deixaria de ser a Igreja. Por conseguinte, a Declaração de Barmen testemunhou a importância da memória e da História na identidade da Igreja e sua confissão. Barth, o maior «projectista» da Declaração de Barmen, lamentou mais tarde não ter ter feito da solidariedade para com os Judeus a faceta decisiva do texto.
O único que tornou límpido como água cristalina que o racismo denega o Evangelho foi Dietrich Bonhoeffer, ele próprio influenciado por Barth. O ensaio de Bonhoeffer «A Igreja e a Questão Judaica» declarou publicamente que a comunidade é chamada «não apenas a pôr ligaduras nas vítimas sujeitas à roda, mas a estragar a própria roda. Tal acção seria acção política directa.» (...) O próprio Bonhoeffer teve muitíssimas oportunidades de alcançar a segurança se tivesse ido para Londres exercer o seu cargo de pastor, já para não falar das ofertas recebidas para ir ensinar na América-- mas comprometera-se a servir o seu rebanho da Igreja Confessante. Em Nachfolge («O Discipulado») ele escreveu: «Quando Cristo chama um homem, ele ordena-lhe que venha e morra.» A sua ênfase na «graça dispendiosa» era uma crítica ao que designava por «graça barata» de todas as sínteses de Cristo com a cultura."

Quanto à tradução portuguesa apenas dois adjectivos: horrível, horrível. Se fosse dono da Teorema teria vergonha em ter um livro meu assim editado. De bom apenas as citações bíblicas, que já são as da Bíblia de Almeida, de João Ferreira Annes d`Almeida. De resto são erros ortográficos, gralhas, nomes errados, frases mal construídas, notas de rodapé... Parece um livro traduzido pelo tradutor do google.
É que é mesmo inacreditável. Aquele ditado que diz que o pior é sempre possível não sei se não acaba aqui, no que a estas questões diz respeito.


2. Lamentável é, também, o tratamento que a editora Cavalo de Ferro dá ao maior escritor do seu catálogo: Flannery O`Connor. A capa do novo título agora publicado é muito má e das citações escolhidas apenas uma é boa, a de José Tolentino Mendonça. Não gostei e não sabia que se podia retirar de um texto medíocre uma citação para funcionar como engodo. É que o texto de José Mário Silva no dn+, o ano passado, é medíocre. Quem já leu alguma Flannery O`Connor percebe como aquela recensão, artigo de jornal ou o que mais for, diz nada.
O texto de Pedro Mexia no ípsilon de ontem é melhor mas também fica aquém das expectativas. Começa logo mal, na minha opinião: "Os elementos essenciais dos dois volumes de contos e dos dois romances de Flannery O`Connor são a obsessão religiosa e a questão racial." Também são mas não são. Também. Como caracterizaríamos, então, esse outro colosso que é o conto "A Lenda de S. Julião Hospitaleiro", de Gustave Flaubert?
Acho que quando escrevemos sobre alguém devemos conhecer/dominar um pouco, pelo menos, sobre o que o autor escreveu. Para isso devemos ler e antes de escrever reflectir longamente. Pelo menos no caso de Flannery. Se tivesse de escrever sobre ela e sobre o que ela escreveu leria antes os contos completos e alguma biografia e alguma bibliografia e reflectiria. E não é preciso ir muito longe, podíamos começar pela frase de Thomas Merton: "When I read Flannery O`Connor, I do not think of Hemingway, or Catherine Anne Porter, or Sartre, but rather of someone like Sophocles. What more can you say for a writer? I write her name with honor, for all the truth and all the craft with which she shows man`s fall and his dishonor." (negrito meu).
É que esta frase diz tudo e é por isso que não é sobre "obsessão religiosa e a questão racial". Peguemos por exemplo no conto "O Festival de Partridge". O que havemos de dizer sobre ele? Tudo, não é? Lê-se e pergunta-se: por onde tens andado? Quém é que te viciou os pensamentos e as atitudes? Tanta mesquinhez porquê? É um soco violento na face, mas uma pessoa agradece. Sempre que leio Flannery O`Connor a minha vida muda. A pirâmide é fodida.
Custou-me muito não trazer para casa este "Tudo o que sobe deve convergir" mas já pensei melhor e vou lá buscá-lo. Rasgo-lhe a capa e assunto arrumado.
Quando em Portugal alguém escrever sobre Flannery O`Connor que não se esqueça de ler este texto de José Tolentino Mendonça publicado no mil folhas, em Setembro do ano passado. É que Robert Bressons a dizer que nunca tinha visto nenhum filme de Carl Dreyer e Carl Dreyer a dizer que nunca tinha visto nenhum filme de Robert Bresson parece-me que não há muitos.

"Descobrir Flannery O’Connor


1.
Há quem, do labor de Mary Flannery O’Connor (dois romances e o fragmento de um terceiro; uma trintena de contos; ensaios e cartas), retenha apenas o olho agudo, o formidável ouvido minucioso, o dente duro. E compreende-se: o seu virtuosismo dá vertigens. Ela persegue a gesticulação, as injunções, as manias; ela apanha o timbre e os clichés de todo o género para, irremediavelmente, soterrar o leitor debaixo do riso e do terror. Sim, há até uma ascendência: o grotesco como tradição literária, naquele Sul infestado de contadores populares e de profetas, o Sul de Poe e Faulkner. Mas «não se pode dizer que Cézanne pintava maçãs sobre uma tolha e pretender ter dito aquilo que Cézanne pintava». Vejamos como Flannery se explica: «Quando uma criança se põe a desenhar, não tem a intenção do grotesco, mas procura simplesmente transcrever aquilo que vê. E como o seu olhar é directo, vê linhas que criam movimento... A mim interessam-me as linhas que criam movimento espiritual». Podem, de facto, coexistir modos diferentes de ler as suas narrativas originalíssimas, ocres, desdenhosamente esplêndidas. O tempo tem tornado evidente que elas pertencem à antologia das grandes narrativas do Ocidente. Contudo ela as escreveu de um modo apenas, e de nenhum outro: tudo o que escreveu foi por ser católica; o motor da sua percepção foi a Fé somente; e todos os seus motivos remetem para o núcleo vital dos mistérios cristãos.

2.
Nasceu no ano de 1925, em Savannah, uma cidadezinha da Geórgia, e viveu a maior parte da sua breve vida numa fazenda, a quatro milhas da remota Milledgeville, tratando de pavões (possuía quarenta!). Não manifestava nenhuma nostalgia pelos anos académicos que tinha passado em Connecticut e New York, onde estudou literatura e arte. Foi tomando consciência do que significava ser católica e pertencer ao Sul, singular mundo a que chamavam Bible Belt, persistentemente bíblico na sua rudeza, dialecto e imaginação. Conta-se, em anedota, que um sulista perguntar-se-á menos se está a sonhar caso encontre, no seu caminho, um anjo ou uma sarça ardente que um agente de seguros. Flannery sabia que um empobrecimento da imaginação significa também um empobrecimento geral da vida, e liga-se profundamente a esse Sul, estrito mas imenso, onde a História Sagrada ainda permite ao mais desprovido homem comum estabelecer vínculos com o universal e o divino, e contemplar, numa sub specie aeternitatis, todas as suas acções. Sente-se mais perto dessa religiosidade, mesmo nas expressões de fervor tidas por arcaicas, do que daquela «refinada, para quem o sobrenatural é uma fonte de embaraço e a religião verdadeiramente se tornou um reflexo da sociologia e da cultura».

Começou a ler, com afinco e ordem, quando entrou para a universidade. Amava, mais que todos, Conrad, para quem a finalidade da literatura era «render justiça, no mais alto grau, ao universo visível». Quantas vezes, ela repetiu e se reviu nesta afirmação! Recusava os escritos de Truman Capote, Tenessee Williams ou Allen Ginsberg, e isso também a ilumina. Leu os católicos, Bernanos, Bloy, Green, Waugh; os russos (mais Dostoievski e Chekov que Tolstoi); aprendeu alguma coisa de Hawthorne, Flaubert, Balzac e Kafka, mesmo se, deste último, garante que não conseguiu terminar um único romance; leu Faulkner, Edgar Allen Poe e quase todo o Henry James («por um sentido de dever e por ter a sensação, quando leio James, de que alguma coisa aconteça, ainda que muito lentamente, mas todavia aconteça»). T.S.Eliot, sobretudo o de “Terra Devastada”, foi leitura que acompanhou a escrita do seu romance inaugural (“A sabedoria no sangue”). Mas a sua formação literária receberia também um impacto decisivo de referências de outro campo. «Qualquer disciplina – há-de ela confessar – vos pode ajudar a escrever…Qualquer coisa que vos ajude a ver». A ela ajudaram-na Aristóteles e São Tomás de Aquino; São João da Cruz e Teresa de Ávila; Jung, Teilhard de Chardin, Maritain, Guardini, entre outros.

No fim, no princípio, a meio de todo este arsenal, a necessidade irreprimível de buscar na solidão da própria vida, nas suas orlas nevadas, nas suas avalanches silenciosas e degelos incalculáveis: «Na verdade, quem quer que tenha sobrevivido à própria infância possui bastante informação sobre a vida, para o resto dos seus dias. Quem não for capaz de retirar alguma coisa de uma experiência reduzida, provavelmente não o conseguirá nem de uma mais vasta. O dever do escritor é contemplar a experiência». Por isso, quando lhe perguntavam se achava que a universidade sufocava os potenciais escritores, ela respondia: «Na minha opinião, ainda não sufoca o suficiente. Com um bom professor tantos best-sellers se teriam podido evitar». Era assim o seu humor.

3.
Sobre a sua arte, Flannery escreveu: «A narrativa é a mais impura, a mais modesta e a mais humana das artes». As primeiras histórias datam desses tempos escolares, uma estação que se diria talvez precoce, mas que nela rebenta com um fulgor decidido. A tese que apresenta aos 22 anos de idade é constituída por um conjunto de sete contos. Provavelmente ninguém se chegou a aperceber de que, naquele modesto volume dactilografado, estavam alguns dos mais belos contos do século XX.

4.
As suas narrativas podem ser classificadas como absurdas e grotescas, mas ela prefere chamá-las literais, «como é literal o desenho de uma criança». Tudo, no fundo, encontra verificação no olhar. Não lhe compete alterar ou transformar a realidade em função de um verdade abstracta: «aquilo que é, isso apenas se deve afrontar». Ela, e aqui entra o seu catolicismo, renuncia a toda a pretensão gnóstica ou maniqueia que separe a acção do sobrenatural da realidade concreta observável ou afaste a natureza tal como ela é, com as suas rugosidades, infâmias, corrupções e soluços, da habitação, imprevisível mas segura, da Graça. Flannery O’Connor contrapõe-se, com todas as suas forças, à redução do sobrenatural a um cliché piedoso: «mantenho que quanto mais um escritor deseja tornar manifesto o sobrenatural, mais deva tornar real o mundo natural, pois se os leitores não aceitam o mundo natural, certamente não aceitarão nenhum outro».

Para falar do Mistério da Graça ela sabe que é preciso percorrer «o território do Diabo», e fazê-lo sem abstracções, conformando-se à doutrina tradicional do livre-arbítrio: a liberdade humana pode, de muitas maneiras, decretar o fechamento à Graça, ser uma subtilíssima e inexpugnável muralha ao seu trânsito. Mas, defende numa das suas cartas, «a Graça, segundo o pensamento católico, pode usar, e efectivamente usa, como seu meio aquilo que é imperfeito, aquilo que é puramente humano, e até o falso. Afastar-se da Graça é uma questão de decisão, um acto da vontade, um gesto que envolve sempre a alma na sua inteireza. Segundo o modo de pensar protestante a Graça e a natureza não têm muito a compartilhar. [Os meus personagens], por causa da sua hipocrisia, da sua humanidade e da sua banalidade, jamais poderiam ser um meio para a Graça. Precisamente por que vejo as coisas de outra maneira sou uma escritora católica». A Graça é o acontecimento perante o qual o homem entende o seu destino, o seu verdadeiro destino.

Por isso, na poética da escritora, há uma economia identificável, uma espécie de ritmo interior em três andamentos: 1) Parte-se do ponto de vista de um personagem, demasiado seguro da sua visão existencial, social ou religiosa, e sobre a qual fundou estavelmente a sua vida; 2) Por uma imperceptível ou violenta irrupção, mas sempre «por um alto preço», o personagem é reconduzido à realidade e é assim colocado «perante o seu momento de Graça»; 3) Face a esta intromissão do divino, nenhum personagem pode permanecer no meio termo: «tudo, em última instância, ou é salvo ou é perdido».

Nas últimas linhas, de cada um dos seus contos, emerge qualquer coisa de definitivo que deriva dessa experiência precipitada, onde à vida foi permitido contemplar o seu reverso. Para esses quadros, inesquecivelmente imóveis, a prosa torna-se drástica, ampla e lírica, assumindo o tom liberatório ou terrífico das manifestações sagradas. Num exemplar da obra de Mircea Eliade, Patterns in Comparative Religion, pertencente à biblioteca de Flannery O’Connor, estas palavras aparecem sublinhadas: «É quase certo que tudo aquilo que o homem tocou, tudo com o qual estabeleceu contacto ou aplicou o seu amor isso pode transformar-se numa hierofania».

5.
Corriam os anos 50, «os desgostosos anos 50», como ela dizia, longínqua de «todas as suas poses». Na América dessa época o que não faltava era religião. O Congresso introduzia nas fórmulas de juramento a expressão “Under God”. As notas de dólar exibem o “In God We trust”. Firma-se uma aliança entre nacionalismo e teísmo para a sacralização do universal “American Way of life”. A religião é um valor propagado e correcto, um valor cívico. Mas a experiência de Deus é um anacronismo. E Flannery sabe que os seus leitores – e isto vale para o leitor moderno em geral - «são aqueles convencidos de que Deus está morto».

Contudo, nem sobre os leitores católicos, constrói ilusões: sabe-os domesticados por uma sub-literatura de boas intenções e maneirismos e uma estética viciosamente adocicada, que pretende dar respostas rápidas àquilo que obviamente não tem resposta. «É muito mais duro crer, que não crer», mas quantos crentes suportam semelhante fardo?

Ela expõe os pressupostos do seu ofício, em conferências, em cartas, em notas publicadas no semanário da diocese de Atlanta, «The Bulletin». Diz gostar especialmente de «uma definição muito fria e muito bela» de São Tomás de Aquino que designava a Arte como «razão em acto». Ou daquela de Jacques Maritain, em Art et Scolastique, que fala da Arte como «habitus», disposição estável e permanente, cuja base, tanto na substância como na forma, é a verdade. Defende que o tipo de visão que o escritor de narrativa deve desenvolver é a anagogia: «os comentadores medievais das Escrituras distinguiam três tipos de significado no nível literal do texto sagrado: um alegórico, onde um facto aludia a outro; um tropológico ou moral, que dizia respeito ao agir; e um anagógico, que concerne à vida divina e à nossa participação nela». O único significado, insistia, colhe-se na história, enquanto experiência e não abstracção.

6.
Parece-me que falta ainda falar da doença. O mesmo Lupus erythematosus, que vitimara já o pai, tinha ela dezasseis anos, veio também a declarar-se nela aos vinte cinco, quando escrevia, e estava longe de concluir, o primeiro dos seus romances. Transfusões, maciças doses de cortisona, queda do cabelo, insónias prolongadas, desfiguração do rosto, infecções intermináveis, tumor. Aos vinte e nove anos move-se apenas com a ajuda de uma bengala, e aos trinta, com a de duas muletas de alumínio, impecavelmente polido. Não podia apanhar sol. Tinha de usar sempre mangas compridas, luvas e chapéus enormes, como se de uma prisioneira da sombra se tratasse. «Tenho suficiente energia para escrever, e como é tudo aquilo que devo fazer na terra, posso dar-me por satisfeita». Falava raramente de tudo aquilo, e, quando o fazia, mantinha uma delicada, quase irónica, indiferença. Como se não fosse isso essencial. E quando se ria, a sua dor «aumentava 100%». «Num certo sentido - deixou ela escrito – a doença é um lugar, mais instrutivo que uma longa viagem pela Europa; é um lugar onde jamais encontras companhia; ninguém pode seguir-te».

7.
Quando se descobre enferma de Lúpus, encomenda o primeiro casal de pavões, que depressa se multiplicam, para horror da mãe. Eles devastam os seus corredores de crisântemos e rosas, e fazem-no sistematicamente, sem parar, mesmo quando não têm fome. Pendurados nos cedros das traseiras, interrompiam a noite num coro implacável e implorante. E quem dormia sonos inquietos, muitas vezes se perguntava se estaria acordado ou se sonhava.
Flannery descrevia esse canto assim: «Para os melancólicos o som é melancólico, para os histéricos é histérico. A mim sempre me pareceu uma ovação dirigida a uma parada invisível».

Flannery O’Connor morreu no dia 3 de Agosto de 1964. Contava trinta e nove anos de idade."


posted by Luís Miguel Dias sábado, dezembro 22, 2007

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