terça-feira, janeiro 03, 2006
"Eu ainda não tinha reparado bem no Estaban. Agora que fala, reparo nele. Traz posto um gabão que lhe chega ao umbigo, e por baixo do gabão deita a cabeça de fora qualquer coisa parecida com uma galinha.
Sim, é uma galinha vermelha o que o Esteban leva debaixo do gabão. Vêem-se-lhe os olhos adormecidos e o bico aberto como se bocejasse. Eu pergunto-lhe:
- Ouve lá, Teban, onde conseguiste essa galinha?
- É a minha - diz ele.
- Não a trazias antes. Onde a compraste, hã?
- Não a comprei, é a galinha do meu curral.
- Então trouxeste-a de abastecimento, não?
- Não, trago-a para a cuidar. A minha casa ficou sozinha e sem ninguém para lhe dar de comer; por isso a trouxe. Sempre que saio para longe carrego com ela.
- Aí escondida ainda se afronta. É melhor que a tires cá para fora para lhe dar o ar.
Ele acomoda-a debaixo do braço e assopra-lhe o ar quente da sua boca. Depois diz:
- Estamos a chegar ao despenhadeiro."
Juan Rulfo (trad. Ana Santos), A planície em chamas, cavalo de ferro, 2003.
posted by Luís Miguel Dias terça-feira, janeiro 03, 2006