terça-feira, outubro 25, 2005
"Estrugiu uma gargalhada, ao mesmo tempo harmoniosa e selvática, como se a mulher acabasse de ouvir uma história escandalosa ou pensasse em algo de extremamente divertido. Despiu a camisola, amarfanhou-a toda e expeliu-a para um canto do quarto. Desabotoou os calções e tirou-os; de um momento para outro estava nua em frente do lume, que lhe deu ao corpo um belo esplendor de ouro e laranja. Tinha ombros magníficos e um pescoço escultural. Entre os seios redondos viam-se delicadas veias azuis. Dentro de poucos anos desfolhar-se-ia como uma rosa que recurva as pétalas, mas na actualidade a sua plástica mantinha-se disciplinada pelos exercícios físicos. Embora se conservasse sossegada, notava-se naquele corpo uma vibração subtil; se alguém lhe tocasse na carne, haveria de sentir por baixo a vida estuando, o sangue a correr impetuoso. Enquanto o capitão a olhava com ar indignado, ela avançou majestosa para o vestíbulo, a caminho da escada. A porta da rua estava aberta, e a brisa que vinha de lá erguia-lhe de leve os cabelos bronzeados."
Carson McCullers (trad. Cabral do Nascimento), Reflexos nuns Olhos de Oiro, Relógio D`Água, 1989.
posted by Luís Miguel Dias terça-feira, outubro 25, 2005