segunda-feira, julho 04, 2005
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fotograma do filme Nostalgia de Andrei Tarkovski
"Um amigo
Num daqueles dias de outono, em que nos queima a vermelha labareda das folhas, um amigo pedia que lhe contasse uma história. «Salva-me a vida, conta-me uma história». E eu recordei aquela mulher das Mil e Uma Noites, que encadeava, com doçura e desespero, uma história na outra, pois só a história infinita nos permite escapar à maldição da morte.
Um amigo é uma história que nos salva."
Mário Rui de Oliveira, O Vento da Noite, Assírio & Alvim.
"Os amigos
Esses estranhos que nós amamos
e nos amam
olhamos para eles e são sempre
adolescentes, assustados e sós
sem nenhum sentido prático
sem grande noção da ameaça ou da renúncia
que sobre a luz incide
descuidados e intensos no seu exagero
de temporalidade pura
Um dia acordamos tristes da sua tristeza
pois o fortuito significado dos campos
explica por outras palavras
aquilo que tornava os olhos incomparáveis
Mas a impressão maior é a da alegria
de uma maneira que nem se consegue
e por isso ténue, misteriosa:
talvez seja assim todo o amor"
José Tolentino Mendonça, De Igual Para Igual, Assírio & Alvim.
"O Despertador
Um despertador exposto sobre um tapete cheio de pó era tudo quanto possuía, para vender, o pobre comerciante árabe. Durante dias, reparou que uma velha se interessava pelo relógio. Era uma beduína, pertencente a uma daquelas tribos que voam com o vento.
«Desejas comprá-lo?», perguntou-lhe um dia.
«Quanto custa?»
«Pouco. Mas não sei se o vendo. Se também este desaparecer deixarei de ter um trabalho».
«Então porque o tens exposto?»
«Porque me dá a sensação de viver. E tu porque o queres, não vês que lhe faltam os ponteiros?»
«Faz tiquetaque?», quis saber a velha.
O comerciante deu corda ao despertador fazendo soar um sonoro e metálico tiquetaque. A velha fechou os olhos e percebeu que, na escuridão da noite, podia assemelhar-se a um coração que bate ao lado do seu."
Tonino Guerra (trad. Mário Rui de Oliveira), Histórias para uma noite de calmaria, Assírio & Alvim.
fotograma do filme Last Days de Gus Van Sant.
Lake Of Fire
Where do bad folks go when they die?
They don't go to heaven where the angels fly
They go down to the lake of fire and fry
Won't see them again till the fourth of July
I knew a lady who came from Duluth
She got bit by a dog with a rabid tooth
She went to her grave just a little too soon
And she flew away howling on the yellow moon
Now the people cry and the people moan
And they look for a dry place to call their home
And try to find some place to rest their bones
While the angels and the devils
Fight to claim them for their own
Meat Puppets. Nirvana.
posted by Luís Miguel Dias segunda-feira, julho 04, 2005