domingo, julho 11, 2004
"A realidade foi-se e eu tropecei para fora dela. É como num sonho."
Bill Viola.
"- Papá! Tenho medo, papá! Quando me agarrei à Karin no barco, a realidade foi-se. Entendes?
- Entendo.
- A realidade foi-se e eu tropecei para fora dela. É como num sonho. Tudo pode acontecer, papá. Tudo.
- Eu sei.
- Não posso viver neste novo mundo, papá.
- Podes sim. Ma tens de ter algo a que te agarrar.
- E que é isso? Um Deus? Dá-me provas de que há Deus! Não consegues.
- Consigo, sim. Mas tens de ouvir com atenção o que te digo, Minus.
- Eu preciso de ouvir, papá.
- Só te posso dar uma pequena ideia das minhas próprias esperanças. É a noção de que o amor é algo real no mundo dos homens.
- Mas um tipo especial de amor, claro.
- Todos os tipos de amor. O mais elevado e o mais baixo, o absurdo e o belo. Todos os tipos de amor.
- Um desejo de amor.
- Um desejo e uma negação. Confiança e desconfiança.
- Então o amor é a prova?
- Não sei se o amor prova a existência de Deus ou se é o próprio Deus.
- Para ti, o amor e Deus são a mesma coisa.
- Essa ideia ajuda-me no meu vazio e no meu desespero.
- Diz-me mais, papá!
- De repente, o vazio torna-se riqueza e o desespero, vida. É como um adiamento de pena, Minus. Da pena de morte.
- Papá, se é como dizes, então a Karin tem Deus em seu redor, porque nós a amamos.
- Sim.
- Isso pode ajudá-la?
- Acho que sim...
- Importas-te que eu vá correr, papá?
- Vai! Entretanto, eu trato do jantar. Até daqui a uma hora.
- O papá falou comigo!..."
Ingmar Bergman, "Em Busca da Verdade".
posted by Luís Miguel Dias domingo, julho 11, 2004