sexta-feira, janeiro 02, 2004
“VIAGEM A ITÁLIA” pela mão de Goethe e do Google 3
"Trento, 10 de Setembro, à noite [1786]
"Andei pela cidade, que é antiquíssima e nalgumas ruas apresenta casas novas, de boa construção. Na igreja há um quadro em que o Concílio reunido ouve uma prédica do Geral da Companhia de Jesus." (…)
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“Elia Naurizio, pintado em 1633, e que está na Igreja de Santa Maria Maior, e não na dos Jesuítas.”
“Enquanto eu ali estava, observando a arquitectura, que achei semelhante à das restantes igrejas desta Ordem, entra um homem de idade, que logo tira o barrete preto. A sua sotaina preta, velha e coçada, dava a entender que se tratava de um padre nos seus piores dias; ajoelha junto à grade e levanta-se depois de uma curta oração. Ao voltar-se, diz a meia voz para consigo: «Correram daqui com os Jesuítas, mas não lhes pagaram o que a igreja custou. Eu bem sei quanto ela custou, mais o Seminário, quantos milhares.» Saiu, deixando cair atrás de si a cortina, que eu levantei, esperando. O velho tinha parado no primeiro degrau da escadaria e disse: «O Imperador não quis saber, o Papa é que pagou.» Voltado para a rua, e sem dar por mim, continuou: «Primeiro foram os Espanhóis, a seguir nós, depois os Franceses. O sangue de Abel grita sobre a cabeça do seu irmão Caim!», e nisto foi descendo a escada, sempre a falar sozinho, encaminhando-se para a rua. Provavelmente trata-se de um homem que os Jesuítas sustentavam, que perdeu a cabeça com a terrível queda da Ordem e agora aqui vem todos os dias á procura dos antigos habitantes neste invólucro vazio, lançando maldições sobre os seus inimigos depois de uma breve oração.”
GOETHE (trad. João Barrento), “Viagem a Itália”, Lisboa, Relógio D`Água Editores, 2001, p.p. 32 e 33.
posted by Luís Miguel Dias sexta-feira, janeiro 02, 2004