domingo, janeiro 11, 2004
LITERATURA
"MANHATTAN TRANSFER" II
Cap. II - metropolis
"- Houve cinco alarmes de incêndio - disse um homem. - Que lhe parece? Nos dois andares de cima, toda a gente ficou bloqueada. Isto é obra de um incendiário. Um maldito pirómano.
Havia um jovem sentado, todo encolhido, na berma do passeio, ao lado do candeeiro. Thatcher encontrou-se junto dele, empurrado pela multidão de trás.
- É italiano.
- A mulher dele está dentro do prédio.
- A Polícia não o deixa passar.
- A mulher dele está grávida. Ele não sabe inglês para falar com os polícias.
O homem tinha uns suspensórios azuis atados com um cordel nas costas. Os seus ombros subiam e desciam e, de vez em quando, pronunciava um jorro de palavras lamentosas que ninguém entendia.
Thatcher começou a abrir caminho para sair da multidão. À esquina, um homem olhava para a caixa de alarme de incêndio. Quando passou por ele, Thatcher captou um cheiro a petróleo que se evolava das suas roupas. O homem ergueu o rosto para ele e sorriu. Tinha umas bochechas descaídas e pálidas e uns olhos brilhantes e salientes. Thatcher sentiu, de súbito, os pés e as mãos gelados. «O incendiário. Os jornais dizem que eles vão rondar os incêndios que ateiam.» Começou a caminhar rapidamente para casa e subiu as escadas a correr e fechou a porta do quarto, logo que entrou. O quarto estava silencioso e vazio. Tinha-se esquecido que Susie não estaria à sua espera. Começu a despir-se. Não conseguia esquecer o cheiro a petróleo das roupas do homem."
DOS PASSOS, John (trad. Clarisse Tavares), "Manhattan Transfer", Lisboa, Europa-América, 1994, p. 19.
posted by Luís Miguel Dias domingo, janeiro 11, 2004