A montanha mágica

quinta-feira, dezembro 04, 2003

Henrik Johan Ibsen (1)

teatro




"Uma Casa de Boneca" de Henrik Johan Ibsen (1828-1906)



Pictures of the first performance at Det Kongelige Teater. Betty Hennings as Nora, Emil Poulsen as Helmer.


"Nora – Oh, Torvald, tu não és homem capaz de me transformar na mulher certa para ti!
Helmer – Como podes dizer isso?
Nora – E eu…? Acaso estou preparada para educar os meus filhos?
Helmer – Nora!
Nora – Tu próprio não disseste há pouco que não te atrevias a confiarmos?
Helmer – Disse-o num momento de irritação. Pensas realmente que eu estava a falar a sério?
Nora – Penso, e tinhas toda a razão. Não estou à altura dessa tarefa. Antes, preciso de fazer outra coisa. Tenho de começar por me educar a mim própria. Tu não me podes ajudar. É algo que eu tenho de fazer sozinha. É por isso que te deixo.
Helmer (salta) – Que disseste?
Nora – Preciso de ser independente se quero encontrar a verdade sobre mim própria e sobre a vida. Não posso, portanto, continuar a viver contigo.
Helmer - Nora, Nora!
Nora – Vou-me embora, agora. Esta noite fico em casa da Cristina…
Helmer – Enlouqueceste? Não tens o direito de fazer isso! Proíbo-te!
Nora – Já não te servirá de nada tentares proibir-me. Levarei apenas o que me pertence. Não quero nada de ti, nem agora, nem nunca.
Helmer – Que loucura é essa?
Nora – Amanhã vou para casa, quero dizer, para a minha terra natal. Será mais fácil encontrar lá trabalho.
Helmer – Mas estás cega? Não tens experiência nenhuma da vida…
Nora – Tentarei arranjar alguma, Torvald.
Helmer – Abandonar a tua casa, o teu marido, os teus filhos! Já pensaste no que as pessoas vão dizer?
Nora – Não posso levar isso em atenção. Sei apenas que tenho de fazer isto.
Helmer – Mas é monstruoso! Esqueces os teus deveres mais sagrados?
Nora – A que chamas, tu, os meus deveres mais sagrados?
Helmer – Preciso dizer-te? O teu dever para com o teu marido e os teus filhos.
Nora – Tenho outros deveres igualmente sagrados.
Helmer – Não tens, não. Que outros poderiam ser?
Nora – O dever para comigo mesma.
Helmer – Antes de tudo, és mulher e mãe.
Nora – Já não acredito nisso. Antes de tudo sou uma pessoa, como tu… ou, pelo menos, tentarei vir a sê-lo. Sei muito bem que a amioria das pessoas pensam como tu, Torvald, e que nos livros também se encontram esse tipo de ideias. Mas eu já não estou disposta a aceitar o que as pessoas dizem, nem o que está escrito nos livros. Eu própria tenho de reflectir sobre as coisas e tentar encontrar respostas.
Helmer – Não sabes qual é o teu dever para com o teu lar? Não tens nesse ponto um guia infalível… a tua religião?
Nora – Oh, Torvald, eu não sei realmente o que é a religião.
Helmer – Que dizes?
Nora – Sei apneas o que me ensinou o pastor Hansen quando fui crismada. Ele disse que a religião queria dizer isto, que queria dizer aquilo. Quando estiver longe de tudo isto e puder pensar calmamente, essa é uma das questões que eu quero examinar. Quero saber se o que o pastor Hansen disse é verdade… ou, em todo o caso, se é verdade para mim.
Helmer – Oh, mas nunca se ouviu semelhante coisa da boca de uma mulher! Se a religião não te mostra o caminho, deixa-me, pelo menos, apelar à tua consciência. Suponho que ainda te resta algum sentido moral? Ou… será que não? Vá, responde-me.
Nora – Oh, Torvald, não é fácil responder a isso. Não sei. Não sei onde me situo nessas questões. Sei apenas que querem dizer coisas diferentes para cada um de nós. Também fiquei a saber agora que algumas leis não são como eu pensava, mas não posso acreditar que sejam justas. Então uma mulher não tem o direito de poupar um desgosto ao seu pai moribundo, ou salvar a vida do seu marido? Não posso acreditar nisso.
Helmer – Estás a falar como uma criança. Não compreendes nada da sociedade em que vives.
Nora – Não, não compreendo. Mas tenciono aprender. Hei-de saber quem tem razão, se a sociedade, se eu."

posted by Luís Miguel Dias quinta-feira, dezembro 04, 2003

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