sábado, novembro 22, 2003
Lauren Hartke 2
"Peço-lhe que me explique o significado do vídeo que é projectado na parede do fundo ao longo de toda a peça. O filme mostra uma estrada de duas faixas, com pouco tráfego. Um carro passa num sentido, depois vem outro em sentido contrário. Num dos cantos da imagem, um mostrador digital regista a passagem do tempo.
- Tem a ver com o passado e o futuro – diz ela. – Aquilo que está ao nosso alcance conhecer e aquilo que não está.
- Aqui, porém, conhecemos ambos.
- Conhecemos ambos. Vemos ambos – acrescenta ela, e depois cala-se.
Fico parada à espera. Como um pedacinho do meu baba ghanouj. Olho para Hartke. O que é um baba ghanouj?
- Talvez a ideia seja pensar no tempo de uma maneira diferente – retoma ela, ao fim de alguns minutos. – Parar o tempo ou prolongá-lo ou torná-lo aberto. Criar uma natureza morta que seja viva, não pintada. Quando o tempo pára, o mesmo acontece connosco. Nós não paramos, ficamos despojados, menos seguros de nós mesmos. Não sei. Quando sonhamos ou temos muita febre ou estamos drogados ou deprimidos, é ou não verdade que o tempo abranda ou parece parar? Que é que resta? Quem resta?"
DeLILLO, Don (trad. Paulo Faria), "O Corpo Enquanto Arte", Lisboa, Relógio D`Água Editores, 2001, p.p. 106 e 107.
posted by Luís Miguel Dias sábado, novembro 22, 2003