A montanha mágica

terça-feira, outubro 14, 2003

LITERATURA

"- É muito simpático da tua parte, querida, mas eu gostava que continuássemos amigos. Longas visitas não são boas para as amizades.
- E se não lhe chamarmos visita? Se lhe chamarmos refúgio? Aceitarias um refúgio sem termo certo?
- Queres dizer asilo? Não é tão grave quanto isso, Lucy. Não sou um fugitivo.
- A Roz disse-me que o ambiente não era dos melhores.
- Fui eu que quis assim. Ofereceram-me um compromisso que eu não pude aceitar.
- Que tipo de compromisso?
- Reeducação. Reformulação do carácter. A palavra-chave era aconselhamento.
- E és assim tão perfeito que não te possas submeter a um pouco de aconselhamento?
- Faz-me lembrar a China de Mão. Retracção, autocrítica, pedidos de desculpa em público. Sou antiquado, preferia que me encostassem a uma parede e me fuzilassem. Ficava mais satisfeito.
Fuzilado? Por teres um caso com uma aluna? É um pouco extremista, não achas, David? Deve estar sempre a acontecer. Podes crer que aconteceu quando eu andava a estudar. Se todos os casos fossem julgados, a profissão era dizimada.
Ele encolhe os ombros. – Vivemos numa época puritana. A vida particular é assunto público. A lascívia é respeitável, a lascívia e o sentimento. Eles queriam espectáculo: que eu batesse no peito, que mostrasse remorsos, lágrimas se possível. Na verdade, um programa de televisão. Não lhes fiz a vontade.
Ia acrescentar: «A verdade é que queriam castrar-me», mão não pode dizer essas palavras, não à frente da filha. Na verdade, agora que se põe no lugar de outra pessoa, a tirada parece-lhe melodramática, excessiva.
- Quer dizer que ficaste na tua e eles na deles. Foi isso?
- Mais ou menos.
Não devias ser assim tão inflexível, David. Não é nada heróico ser-se inflexível. Ainda estás a tempo de voltar comm a palavra atrás?
- Não, a sentença é definitiva.
- Não podes apelar?
- Não. Também não me posso queixar. Uma pessoa não pode considerar-se culpada de depravação e esperar um dilúvio de simpatia. Pelo menos a partir de certa idade. A partir de certa idade uma pessoa deixa pura e simplesmente de ser apelativa e é tudo. Só nos resta cerrar os dentes e viver o resto da vida. Cumprir a pena.
- Bom, é uma pena. Podes cá ficar o tempo que quiseres. Sejam quais forem as condições."

COETZEE, J.M. (trad. José Remelhe), "Desgraça", Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1999, p.p. 71 e 72.

posted by Luís Miguel Dias terça-feira, outubro 14, 2003

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São horas, Senhor. O Verão alongou-se muito.
Pousa sobre os relógios de sol as tuas sombras
E larga os ventos por sobre as campinas.


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