A montanha mágica

sexta-feira, maio 02, 2003

FARÖ

(...) «Quanto a isso de que o homem tem culpa por todos os homens e por tudo, para além dos seus pecados próprios, o seu raciocínio é muito correcto e é admirável como o senhor conseguiu abranger esta ideia em toda a sua plenitude. Também é uma verdade das verdades que, quando as pessoas compreendem finalmente esta ideia, chegará para elas o reino os céus, não em sonho mas na realidade.» «Mas quando se realizará isso, se é que alguma vez se realiza? Não será apenas um sonho?», exclamei com amargura. E ele: «Já não tem fé nisso, está pregá-lo e, ao mesmo tempo, não tem fé. Saiba, então, que a realização deste sonho está iminente, acredite, embora não seja para já, porque para cada coisa existe a sua lei. É um fenómeno espiritual, psicológico. Para transformar o mundo é preciso que as pessoas enveredem, psicologicamente, por outro caminho. Antes de nos tornarmos irmãos de cada qual não haverá fraternidade. Nunca as pessoas concordarão, com base em qualquer vantagem ou em qualquer ciência, partilhar com justiça a sua propriedade e os seus direitos. Cada qual achará que recebeu pouco, toda a gente se queixará, invejará os outros e exterminá-los-á. Pergunta-me quando se realizará esse sonho. Realizar-se-á, sim, mas primeiro deve acabar o período da solidão humana.» «Que solidão?», pergunto-lhe eu. «A solidão que agora reina por todo o lado, especialmente no nosso século, e ainda vem longe o fim dela. Porque cada um, hoje em dia, deseja isolar cada vez mais a sua pessoa, quer experimentar em si mesmo a plenitude da vida e, no entanto, o resultado é que todos os seus esforços, em vez da plenitude da vida, acabam num suicídio absoluto, porque em vez da plenitude da definição da sua personalidade entra num isolamento total. Porque todos, no nosso século, se separam, cada qual se isolando na sua toca, cada qual se afastando do outro, escondendo-se e escondendo o que possui, acabando por rejeitar os outros e ser rejeitado pelos outros. Acumula a sua riqueza em solidão e pensa: que forte eu sou, que rico... e mal sabe, o louco, que quanto mais acumula mais mergulha na impotência suicida. Porque está habituado a contar apenas consigo e, como unidade, se separou do comum, habituou a sua alma a não acreditar na ajuda dos outros, nas pessoas e na humanidade e apenas receia que o seu dinheiro e os seus direitos adquiridos se percam. Hoje, por todo o lado, a mente humana irónica começa a perder consciência de que o verdadeiro sustento do indivíduo não consiste no seu esforço pessoal e solitário, mas num esforço em comunidade humana. É inevitável, porém, que chegue o fim deste terrível isolamento e que se compreenda, de uma vez por todas, como é antinatural esta separação de uns dos outros. Será assim o espírito da época, e as pessoas espantar-se-ão por terem passado o tempo na escuridão, sem verem a luz. Surgirá então nos céus o sinal do filho do homem... Mas, até lá, é necessário guardar bem a bandeira e, de vez em quando, nem que seja como acto isolado, um homem sozinho deve dar o exemplo e tirar a alma do isolamento para a elevar até à façanha da convivência em amor fraterno, nem que seja na qualidade de maluquinho religioso. É necessário isso para que não morra a grande ideia...» (...)

in Os Irmãos Karamázov, Fiódor Dostoiévski.

posted by Luís Miguel Dias sexta-feira, maio 02, 2003

Powered by Blogger Site Meter

Blogue de Luís Dias
amontanhamagica@hotmail.com
A montanha mágica YouTube




vídeos cá do sítio publicados no site do NME

Ilusões Perdidas//A Divina Comédia

Btn_brn_30x30

Google Art Project

Assírio & Alvim
Livrarias Assírio & Alvim - NOVO
Pedra Angular Facebook
blog da Cotovia
Averno
Livros &etc
Relógio D`Água Editores
porta 33
A Phala
Papeles Perdidos
O Café dos Loucos
The Ressabiator

António Reis
Ainda não começámos a pensar
As Aranhas
Foco
Lumière
dias felizes
umblogsobrekleist
there`s only 1 alice
menina limão
O Melhor Amigo
Hospedaria Camões
Bartleby Bar
Rua das Pretas
The Heart is a Lonely Hunter
primeira hora da manhã
Ouriquense
contra mundum
Os Filmes da Minha Vida
Poesia Incompleta
Livraria Letra Livre
Kino Slang
sempre em marcha
Pedro Costa
Artistas Unidos
Teatro da Cornucópia


Abrupto
Manuel António Pina
portadaloja
Dragoscópio
Rui Tavares
31 da Armada

Discos com Sono
Voz do Deserto
Ainda não está escuro
Provas de Contacto
O Inventor
Ribeira das Naus
Vidro Azul
Sound + Vision
The Rest Is Noise
Unquiet Thoughts


Espaço Llansol
Bragança de Miranda
Blogue do Centro Nacional de Cultura
Blogue Jornal de Letras
Atlântico-Sul
letra corrida
Letra de Forma
Revista Coelacanto


A Causa Foi Modificada
Almocreve das Petas
A natureza do mal
Arrastão
A Terceira Noite
Bomba Inteligente
O Senhor Comentador
Blogue dos Cafés
cinco dias
João Pereira Coutinho
jugular
Linha dos Nodos
Manchas
Life is Life
Mood Swing
Os homens da minha vida
O signo do dragão
O Vermelho e o Negro
Pastoral Portuguesa
Poesia & Lda.
Vidro Duplo
Quatro Caminhos
vontade indómita
.....
Arts & Letters Daily
Classica Digitalia
biblioteca nacional digital
Project Gutenberg
Believer
Colóquio/Letras
Cabinet
First Things
The Atlantic
El Paso Times
La Repubblica
BBC News
Telegraph.co.uk
Estadão
Folha de S. Paulo
Harper`s Magazine
The Independent
The Nation
The New Republic
The New York Review of Books
London Review of Books
Prospect
The Spectator
Transfuge
Salon
The Times Literary...
The New Criterion
The Paris Review
Vanity Fair
Cahiers du cinéma
UBUWEB::Sound
all music guide
Pitchfork
Wire
Flannery O'Connor
Bill Viola
Ficções

Destaques: Tomas Tranströmer e de Kooning
e Brancusi-Serra e Tom Waits e Ruy Belo e
Andrei Tarkovski e What Heaven Looks Like: Part 1
e What Heaven Looks Like: Part 2
e Enda Walsh e Jean Genet e Frank Gehry's first skyscraper e Radiohead and Massive Attack play at Occupy London Christmas party - video e What Heaven Looks Like: Part 3 e
And I love Life and fear not Death—Because I’ve lived—But never as now—these days! Good Night—I’m with you. e
What Heaven Looks Like: Part 4 e Krapp's Last Tape (2006) A rare chance to see the sell out performance of Samuel Beckett's critically acclaimed play, starring Nobel Laureate Harold Pinter via entrada como last tapes outrora dias felizes e agora MALONE meurt________

São horas, Senhor. O Verão alongou-se muito.
Pousa sobre os relógios de sol as tuas sombras
E larga os ventos por sobre as campinas.


Old Ideas

Past