A montanha mágica

terça-feira, maio 20, 2003

DIÁLOGOS

José Pedro Croft Escolhe Ellsworth Kelly





Há um olhar breve e intenso, transbordante de energia e luz. Depois, sem hesitar, José Pedro Croft começa a rasgar um grande embrulho de papel pardo que estava encostado a uma parede. "Aquilo que me interessa na arte é aquilo que pode ajudar as pessoas a serem mais humanas. A sociedade ocidental contemporânea, que é de uma enorme riqueza, é também uma selva onde as pessoas têm que se anestesiar para sobreviver". Urge, portanto, "fazer relembrar" essas emoções e sensações recalcadas, diz o artista.

Recebe-nos em casa. É lá, ao alcance de um olhar sem esforço, que estão muitas das obras que tem vindo a reunir ao longo dos últimos anos - "A ideia de ter, de possuir, é a ideia de tomar conta, de cuidar, de olhar. A ideia de abandono surge quando alguém não nos presta atenção", diz.

Coleccionar também pode ser isso: conviver e acarinhar.

O embrulho fica finalmente desfeito. Lá de dentro sai um grande díptico emoldurado: dois quadrados, lado a lado, um verde e outro azul, o primeiro a parecer encolher-se, como se uma força lhe sugasse para dentro os lados, o outro como que a ampliar-se, com linhas arredondadas, como que empurradas para fora, dilatadas.

"É nada. O assunto é nada, a não ser a escala. Postos ao lado um do outro, o azul transforma-se em preto, o verde em cinzento. Um é um quadrado a ampliar-se, o outro um quadrado a encolher-se. Está-se ao mesmo tempo a jogar com os planos, os campos - mais aproximados, mais afastados... - e as formas, com as linhas laterais, olhadas de lado, a tornarem-se direitas. Mas mais do que de geometria, estamos a falar de emoções e sensações".

Ellsworth Kelly é um falso purista, um falso geométrico: "Embora tudo isto pareça muito frio, é algo com um calor humano e uma intensidade que não tem nada de ideal, no sentido de uma ideia de abstracção ou de superioridade. O seu trabalho, parecendo muito erudito, vem do vernáculo, dos passeios pelas ruas, de postais de paisagens, de fotografias de jornais... É a vida toda dele".

O braço dobrado de um soldado que segura uma arma transforma-se num rectângulo deformado; os picos de uma cordilheira de montanhas, numa sequência de triângulos: "O Kelly parte de coisas muito orgânicas, para ir depurando, depurando... Tem uma capacidade de síntese extraordinária. Seja uma linha curva que aponta para o infinito, seja uma máscara mortuária, é como se apenas com um detalhe ele nos conseguisse falar de tudo, como se um pormenor conseguisse conter o mundo inteiro. Por isso, na realidade, não estamos a falar de formas, estamos a falar de energias. Não são os objectos que me interessam, são as energias que exprimem".

As cores, como os materiais, têm-nas: "O nosso corpo reaje de maneiras diferentes a um vermelho e a um verde ou a um azul escuro, um preto. Esta é uma peça sobretudo nocturna, com o verde a transformar-se em cinzento e o azul em preto. Por outro lado, tem algo de majestoso, com aquelas linhas que estão sempre em movimento, um movimento lento e solene. Há um curto-circuito na percepção - por isso ele está a lidar com energias".

Voltamos à ideia de síntese: "É como se não fosse preciso pôr nada; já está lá tudo: o peso, a leveza..." Dois quadrados como se fossem uma densidade: "Só uma pessoa com uma grande sabedoria consegue chegar aqui".

$A obra

Título: "Dark Blue/ Dark Green", 2000

Autor: Ellsworth Kelly

"Ellsworth Kelly é um autor que eu acompanho desde há muito tempo", diz José Pedro Croft. Apesar disso, pouco sabe sobre a origem da obra que escolhe para esta conversa e que emprestou para a exposição da Culturgest, "A Arte dos Artistas". "Sei que foi feita numa editora em Los Angeles, mas não preciso de conhecer a história das peças, não me preocupo com isso. Não penso, quando escolho uma coisa para me rodear. São normalmente coisas que tenho dificuldade em entender, mas que me criam um fascínio, uma atracção imediata".

Por VANESSA RATO
Domingo, 04 de Maio de 2003 in Publico.

posted by Luís Miguel Dias terça-feira, maio 20, 2003

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