terça-feira, agosto 26, 2003
Sentado debaixo do grande terebinto XIII
"Passando em revista as provocações e as desinteligências diárias entre José e os irmãos, verificaremos que as causas fundamentais das más relações eram a inveja e a presunção. Se quisermos ser justos, não nos será fácil decidir se a culpa vinha do rapaz ou do grupo, cada vez mais ameaçador. O nosso desejo de imparcialidade poderia levar-nos a considerar a presunção como fonte principal daquela infeliz situação, que se agravava com o decorrer do tempo, mas também devemos confessar que raramente tem havido no mundo motivo tão forte para a presunção e, por consequência, para causar inveja, como aqui.
Na verdade, raro é que andem juntas na Terra beleza e ciência. Com razão ou sem ela, habituámo-nos a considerar feia a sabedoria e insípida a graça e, pelo que nos diz respeito, a considerá-la insípida sem qualquer outra preocupação. Com efeito, que necessidade pode ter a graça de possuir letras, espírito, sabedoria, se corre o risco de ser desfigurada, destruída com tais atributos? Entre espírito e beleza há um abismo tão grande que a fusão de ambos no mesmo ser afigura-se-nos fora do natural e dá-nos instintivamente uma impressão de divinal. Quem seja imparcial contempla-os necessariamente com enlevo, ao passo que a outros só suscita despeito."
Thomas Mann, "O Jovem José".
posted by Luís Miguel Dias terça-feira, agosto 26, 2003